Founder Dictator
Como empreendedores da internet, cultivamos (infelizmente) a ideia de que possuímos superpoderes. Achamos, ou melhor, temos a certeza de que conseguiremos mover montanhas para atingir os nossos objetivos.Muitas vezes, a vontade de fazer é tanta que a gente passa a ver o mundo de uma forma diferente, criando os conhecidos “campos de distorção da realidade”.
Os referidos “campos de distorção da realidade” não são um problema, muito pelo contrário, os vejo como necessários para se conseguir colocar uma startup de pé.A habilidade de enxergar além do óbvio é precisamente o que faz desses “campos de distorção da realidade” uma ferramenta tão poderosa. Me ajudou muito na construção do HURB.
Contudo, há um perigo! Da mesma forma que esses superpoderes podem impulsionar o crescimento meteórico de uma startup, sem autoconhecimento suficiente, podem, facilmente, levá-la à morte, de forma lenta ou rápida.
Para não destruir ou prejudicar a empresa que você trabalhou tanto para construir, levando-a ao caminho da morte, não fique preso a suas próprias crenças (AKA Bullshitagem) e pare de pensar que tem a habilidade de prever o futuro.
“Bullshit is the greater enemy of the truth than lies are”. Harry Frankfurt, Professor Emérito de Filosofia, da Universidade de Princeton.
Durante os primeiros anos da companhia, você ultrapassou limites e venceu barreiras. O mais revelador, você acredita piamente que fez tudo isso sozinho.
Muitos fundadores vêm sendo moldados como “individualistas”.No seu mundo, o sucesso ou o fracasso, dependem da sua realização individual. Em uma startup, apesar da mídia gostar de exaltar o arquétipo de “fundador solitário”, o sucesso a longo prazo só é possível quando conduzido por times.
Você pode pensar que sabe jogar em um time, mas as chances de você não ser tão bom quanto pensa em “esporte em equipe” são altas.
Você não só foi programado para ser individualista, como também é extremamente bom nisso.
Nada reproduz repetição como sucesso, sem perceber isso, você pode se tornar um “Ditador”, retendo o controle de áreas que não deveria, estabelecendo todos os roadmaps da empresa, e sem querer, acaba “desempoderando” todo o seu time ao longo do caminho. Jogando mais lenha na fogueira, pelo fato de você acreditar, verdadeiramente, que é um indivíduo especial, você costuma vivenciar o sucesso cedo e operando dessa forma tudo aparenta como se não pudesse estar melhor.
Você poderia não conhecer o nome HURB hoje, se eu não tivesse acordado do meu próprio “B.S coma” (acreditar na própria Bullshitagem).
Entre 20011 e 2015 como Fundador/CEO, eu levantei ~R$300 milhões em financiamento após anos de crescimento explosivo.Desde o dia 1, estive profundamente envolvido em cada função da companhia, do desenvolvimento de produto ao marketing e eu acreditava estar recrutando um time incrível, mas não estava.
Me sentia invencível. Então fizemos o que muitas startups em estágio de crescimento fazem: expandimos em múltiplas linhas de produtos, contratamos rápido demais e “compramos crescimento”. Eu participei de cada decisão, eu desenhei estratégias (notam aqui o padrão “Eu”?).
Em cada subida de uma nova aposta juntamos todos os computadores para monitorar a alta nas métricas e, nada.
Dia e noite eu só assistia, enquanto nossa trajetória de crescimento de repente e dolorosamente paralisou.Não era um problema com as métricas, nem com o nosso time.Era um problema comigo.
Eu estava tão envolvido em fazer a direção de cada detalhe que não liderei nada.
Fazendo uma retrospectiva, acho que o sucesso que a empresa vivenciou foi muito com base no excesso de confiança proveniente da fase inicial.
Por sorte, eu aprendi rapidamente que o meu trabalho como CEO não era construir um produto, mas sim construir uma empresa que escala.
Fora de ordem, aqui estão as principais lições aprendidas no HURB:
- Mude de “Product Manager” para “People Manager”: o trabalho de um Fundador muitas vezes é o de “Product Manager”.Enquanto a empresa cresce, você precisa se envolver mais em construir um time capaz de captar oportunidades.
- Otimize o conhecimento e a velocidade: Conhecimento e velocidade vão permitir que a startup ultrapasse o que já está estabelecido. E o único jeito de tornar possível o aprendizado é soltando as rédeas e confiando em pessoas.
- Permita que as pessoas desenhem seu caminho e cometam seus próprios erros: Limite o seu controle a duas condições: (1) somente quando a decisão necessária é estratégica (não tática) e (2) somente quando a decisão tem importância crítica.
Como Fundador, o excesso de confiança é necessário para muitas batalhas pela frente. A não ser que crie formas de garantir a manutenção do seu senso de paranóia, você pode não ter tanta sorte quanto eu tive.
Campos de distorção da realidade são necessários para enxergar o que outros não conseguem, para construir o futuro antes que ele aconteça.Porém, as qualidades que impulsionam a criação de uma startup podem ser as mesmas que atrofiam sua chance de construir uma companhia duradoura.
Esse caminho começa com dois compromissos simples: cultivar o autoconhecimento e passar por cima do ego.
Ambas habilidades são mandatórias para que se consiga atuar em benefício da empresa que está trabalhando tanto para construir.